sexta-feira, 1 de agosto de 2014

PELO AVESSO*


Tudo o mais está esquisito ou estranho demais para meu juízo.
As borboletas não mais carregam sobre suas costas 
as belas manhãs do colorido primaveril antigo.
Meus olhos estão saturados de tantos escuros.
Nem mais as noites são carregadas como dantes
por imensas multidões de vaga-lumes.
Toda a estética do que era belo sumiu no plenilúnio.
Cansado de tanto brilho falso
o sol se escondeu no dia de domingo ou tirou férias...
Eis agora o inusitado cosmogânico 
em que a vida toda se encerra.
Não mais se escuta som de besouros pelo mundo.
Tampouco o barulho das águas frescas correndo nos rios
E o que sobrou dera lugar ao silêncio eterno.
Não há mais chuvas de janeiro nem maio.
Aromas de flores, perfumes dos ventos em seus assobios.
E sem as antigas estórias de trancoso
que alimentavam de sonhos os meninos
e de utopias bonitas os crescidos,
todos os passarinhos desde então,
estão dormindo muito...

Além do que é preciso para tecer as madrugadas.
Os bichos agora têm medo dos matos.
Há alienígenas e vodu por todo canto.
O ato de pensar passou a ser um risco e tanto.
E por conta disso, burros e cavalos 
agora estão pastando nos nossos quartos.
Lendo nossos livros de poesia e catecismo.
Macacos e lobisomens nos atormentam o senso crítico.
A ignorância dos irracionais venceu a inteligência dos homens.
Tudo o mais agora é vazio e tédio imenso... 
Nada mais possui o seu sentido prático.
A vida perdeu seu prumo e não tem sentido 
quem sabe num verso de Drummond e de Vinícius.
A metafísica das coisas caiu no ralo do banheiro.
O absurdo tomou conta por inteiro do racionalismo.
Estamos gregários e perdidos em absoluto
em meio a tantas ideias de rebanhos.
Desde muito, nenhuma filosofia nos basta...
O cosmo é a nossa própria pança.
Tudo o mais é puro desejo e outras vontades.
Há lixo demais no nosso pensamento contemporâneo.
A moda agora é ser medíocre. 
como  moderno é conseguir ser ignorante ao extremo.
Contudo, o poder mundano tem seu preço.
O castigo de Midas está apenas começando.
Silêncio profundo grita aos ouvidos dos elefantes.
Viver agora é um grande risco...
Existe um modismo sistemático de cachorro sardento.
Ser cínico e artificial é ser também elegante e bonito,
além de demasiadamente humano...
O segredo do sucesso é querer a qualquer custo 
levar vantagem em tudo
passando  o tempo todo a perna nos semelhantes.
Tudo está morto ou está mudo.
O solidarismo há muito morreu 
e não ressuscitou ao terceiro dia.
Os homens estão cada vez mais cegos
diante da barbárie e do exício 
pleno de idiotices, cheios de si mesmos.
A morte passou a comanda de vez o mundo.
Enquanto a fauna humana continua insistindo
brincando seriamente com o impossível.
Os homens continuam adormecidos

entretidos demais com o perigo.
Sem ainda se darem conta,
que nunca poderão comer dinheiro.
Ninguém aprendeu ainda a ser feliz.
De modo que, tudo que me resta é o sorriso
todas as vezes que "eles" me chamam de poeta louco.
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(*) José Cícero Silva
In Loucos e Insensatos - inédito 2014
Aurora - CE.

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